Desafios das vendas para escolas particulares no Brasil

Vender para escolas particulares é um desafio que costuma surpreender até mesmo os profissionais mais experientes. À primeira vista, o setor parece promissor: há milhares de instituições espalhadas pelo país, todas com necessidades claras em áreas como tecnologia, formação docente, gestão, comunicação e infraestrutura. Mas, na prática, fechar negócios com esse público costuma ser uma jornada longa e cheia de obstáculos.

Para quem está chegando agora ao blog, meu nome é Raphael Santo. Desde 2017, venho me dedicando à área de vendas no setor educacional. Comecei minha jornada como estagiário e, ao longo dos anos, evoluí para liderar times focados em sucesso do cliente, operações e vendas para escolas particulares de todo o Brasil.

Ao longo da minha trajetória, já comercializei diversos produtos e serviços voltados para instituições de ensino, com características bastante distintas — o que me proporcionou vivência em diferentes abordagens comerciais. Também tive a oportunidade de participar de três diferentes projetos em edtechs, atuando como Sales Advisor na criação e consolidação de processos de vendas específicos para esse setor.

Neste texto, quero compartilhar os principais motivos que tornam essa missão tão difícil — e alguns caminhos para entender melhor esse universo e aumentar suas chances de sucesso.

A sazonalidade é acentuada

O maior susto que um profissional de vendas que vem de outro mercado para o mercado Educacional toma, é como funciona a sazonalidade do setor.

O calendário escolar influencia diretamente o comportamento de compra das escolas e entender essa sazonalidade é fundamental para montar uma estratégia comercial eficiente.

Visão geral da sazonalidade:
  • Janeiro/Fevereiro: A escola está totalmente concentrada em atingir as metas de captação de alunos e finalizar os preparativos para o início do ano letivo. É extremamente difícil conseguir compromissos com gestores nesse período.
  • Março/Abril/Maio: É quando as escolas começam a enxergar os primeiros resultados do ano. Dores e necessidades ficam mais claras e as soluções que não estão funcionando começam a ser questionadas. Aqui surgem as primeiras oportunidades reais de conversa.
  • Junho/Julho/Agosto: É o momento mais estratégico. As escolas iniciam, ainda que superficialmente, o planejamento do próximo ano letivo. Os gestores se tornam mais abertos a escutar novas soluções. O único desafio é a quebra no ritmo provocada pelas férias de julho.
  • Setembro/Outubro/Novembro: Pico do fechamento de negócios. As decisões são tomadas com foco em rematrícula e atração de novos alunos. Muitas escolas usam novas soluções como argumento de valor para retenção e captação. Esse é o momento com maior potencial de conversão.
  • Dezembro: Ainda há negócios sendo fechados, mas em volume menor. A prioridade das escolas está na manutenção e crescimento do alunado para o próximo ano.

Mas vale dizer: cada produto ou serviço tem sua própria dinâmica de sazonalidade.
O serviço que vendo atualmente, por exemplo, é voltado à captação de alunos e por isso segue uma lógica diferente, mais alinhada aos momentos em que as escolas estão preocupadas com atração e retenção de estudantes.

Por outro lado, soluções pedagógicas tendem a seguir uma contratação com sazonalidade mais restrita. Mesmo que a escola goste da proposta, ela reluta em mexer no planejamento anual durante o ano letivo, a não ser em casos muito específicos.

Benefícios, concessão de serviços adicionais e desconto, podem se transformar em uma ferramenta de quebra de sazonalidade.

Apesar de tudo isso, nosso papel é quebrar, o quanto for possível, essa sazonalidade com as armas que temos — seja com produtos de rápida implementação, propostas de entrada com baixo risco ou estratégias de pré-venda bem posicionadas. O importante é mitigar os riscos e fricções que a escola terá ao implementar a sua solução.

Claro sempre considere usar estratégias que não comprometam o negócio, bem como, seja um beneficio real para as escolas que adotam.

Embora o ciclo escolar exista e precise ser respeitado, é possível suavizar essa barreira com boas estratégias, como:

  • Condições comerciais atrativas fora de época (descontos, parcelamentos, piloto gratuito);
  • Clareza sobre o valor imediato gerado pela solução;
  • Comunicação adaptada ao timing do gestor (mostrar como a adoção agora evita um problema futuro);
  • Implantação rápida e sem impacto no cronograma pedagógico ou administrativo.

O Mercado é pulverizado

O mercado de escolas particulares no Brasil é incrivelmente fragmentado. Um simples filtro no INEP Data para escolas privadas com até 200 alunos retorna cerca de 28.249 instituições, o que representa mais de 65% do total. Dentro desse grupo, quase 8 mil escolas têm menos de 50 alunos.

Mesmo grandes grupos educacionais, como o Grupo Salta (com 180 unidades e 130 mil alunos) ou o Grupo Inspira (com 105 escolas e cerca de 58 mil alunos), representam uma fatia ainda pequena do mercado total.

Essa pulverização dificulta a escala das operações comerciais. Em vez de falar com grandes redes centralizadas, é preciso abordar cada escola individualmente — o que exige tempo, personalização da proposta e um time comercial altamente ativo e paciente.

Definição do público-alvo ajuda a diminuir os problemas provenientes desta pulverização

O mercado é vasto e, portanto, cheio de possibilidades, é possível recortar uma região, um valor de mensalidade, o tamanho da escola, quantos professores e até mesmo a quantidade de unidades de um determinado grupo.

Algumas soluções criam seus targets com base em muitas variáveis, como número de alunos, etapa, mensalidade e região. Neste caso é necessário entender, com base nos dados cruzados, qual o tamanho do mercado potencial e assim concluir qual a melhor estratégia para atingir essas escolas.

Sobre a regionalização, por exemplo, apesar da maior concentração de escolas e consequentemente alunos e maior valor médio de mensalidade estar no Sudeste, é preciso compreender que a grande maioria das edtechs estão concentradas nessa região (68,2%) e que, portanto, sua solução vai se deparar com uma concorrência maior. Iniciar sua operação em outras regiões pode te dar vantagem competitiva se, no seu planejamento, o mercado endereçável for atraente.

A maneira como o comercial vai agir, dependerá, entre outros fatores, do tamanho da sua lista de clientes potenciais. 

Uma alternativa interessante é mirar pequenos grupos regionais, que administram 3 a 10 escolas. Embora menores, eles já têm uma estrutura centralizada, capacidade de investimento mais organizada e podem representar uma porta de entrada para outros clientes na região. Pretendo escrever um artigo destinado somente a este tema no futuro, dado todas as oportunidades que enxergo neste recorte de escolas dentro do mercado.

Gestão Escolar em processo de profissionalização

Grande parte das escolas é gerida por educadores, não por administradores. Muitos gestores acumulam funções pedagógicas, operacionais e financeiras. E, em muitos casos, não há uma contabilidade estruturada nem processos de tomada de decisão baseados em indicadores claros.

Essa falta de profissionalização impacta diretamente o ciclo de vendas. Propostas técnicas, com foco em eficiência ou ganho de longo prazo, nem sempre são compreendidas ou priorizadas. Além disso, a ausência de uma estrutura financeira organizada impede o acesso a crédito mais barato, o que limita ainda mais o espaço para investimentos em inovação.

Além disso, a cultura de inovação é lenta. A pandemia acelerou esse processo em parte, mas, no geral, as escolas ainda estão presas a um modelo tradicional que não responde às novas demandas da sociedade e das famílias. Esse é um dos motivos que fazem com que novas soluções encontrem resistência — mesmo quando o problema é evidente.

Simplifique o processo de apresentação da solução, desde a venda até implementação e acompanhamento dos resultados

Conversando com vendedores do setor educacional, percebo com frequência que muitos rapidamente entendem que um alto nível de sofisticação e complexidade na apresentação nem sempre gera mais encantamento. Os gestores escolares, geralmente muito ocupados e acumulando diversas funções, preferem abordagens mais diretas e práticas.

Naturalmente, isso não se aplica a todas as situações. Dependendo do impacto da solução oferecida e do porte da negociação, pode ser necessário adotar uma apresentação mais elaborada, como comentei anteriormente sobre a importância de ajustar a abordagem ao perfil de cada administrador.

A margem das escolas costuma ser apertada

Mesmo as escolas que possuem boa gestão enfrentam um cenário financeiro desafiador. De 50% a 60% da receita de uma escola costuma ser comprometida com folha de pagamento. Cerca de 10 a 11% vai para aluguel. Somam-se a isso contratos com fornecedores, custos operacionais, manutenção e outras obrigações financeiras, o que sobra em média é uma lucratividade de 11%.

Isso significa que a margem de manobra para investimentos é extremamente limitada. O gestor precisa escolher entre manter um professor ou contratar uma nova solução (caso hipotético) — e essa decisão, como você pode imaginar, raramente favorece a inovação, mesmo que ela traga benefícios no médio ou longo prazo.

A fim de se preparar no discurso comercial que entrega valor suficiente a ponto da escola incorporar sua solução, é necessário que as empresas que exploram esse nicho tenha ciência de quatro situações, sendo a primeira a escola optar pagar pelo serviço acreditando que ele trará mais receita, o segundo a escola repassando o valor para os pais e familiares diretamente no reajuste da mensalidade escolar, o terceiro é a escola optando pagar pela conveniência que o serviço oferece e por último pagar para mitigar riscos.

No primeiro caso, a escola incorpora uma solução acreditando que no médio prazo esta solução trará incremento de receita, seja por maior fidelização de alunos, mais atratividade e consequente mais captação de novos alunos ou ganho de percepção de valor no mercado e aumento de mensalidade.

No segundo caso, a escola incorpora sua solução repassando o valor diretamente aos pais e familiares na mensalidade escolar. Nesta situação a escola acredita que os pais verão valor suficiente para pagar um valor mensal maior a fim de ter a solução incorporada no rotina educacional dos filhos.

Na terceira opção, a escola está convencida de que o serviço trará conveniência no dia a dia, retirando algo muito pesado e difícil de gerir por outros meios na rotina escolar.

Por último, a escola reconhece algum risco e, para que não haja maiores problemas futuros, ela opta pelo pagamento de uma determinada solução.

Conhecer o ritmo das escolas é o primeiro passo para o sucesso no setor

Vender para escolas particulares exige muito mais do que uma boa solução. É preciso conhecer o ritmo do setor, adaptar o discurso à realidade de cada instituição, e ser criativo para contornar as barreiras naturais que o mercado impõe.

A boa notícia é que, para quem consegue superar essas dificuldades, há oportunidades reais de impacto — e um potencial enorme de construir relações duradouras com escolas que valorizam parcerias de verdade.

Raphael Santo é Tecnólogo e graduado em Administração pela UFSCar, com 8 anos de experiência na área comercial voltada ao setor educacional. Atua como Head Comercial no marketplace Melhor Escola, do Grupo Quero Educação, e é especialista em estratégias de vendas para instituições de ensino. É também fundador do blog Mercado & Educação, onde, desde 2021, compartilha reflexões, tendências e análises sobre o mercado educacional.

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